Um estudo de caso sobre as ilhas Maricás.
Autora: Dra. Raquel de Azeredo Muniz
O estado do Rio de Janeiro é um ambiente singular em termos de biodiversidade marinha, pois se encontra na fronteira entre duas ecorregiões biogeográficas distintas no litoral brasileiro (Spalding et al., 2007). Sendo assim, abriga tanto organismos adaptados às águas quentes do litoral norte-nordeste, quanto aqueles adaptados às águas frias comuns a porção sul.
O que colabora com essa característica é a presença da ressurgência, que é um fenômeno de chegada à superfície, das águas frias provenientes das ACAS (Águas Centrais do Atlântico Sul), que é mais frequente no período de final de primavera e início do verão, quando os ventos do quadrante norte-nordeste são mais frequentes e intensos (Valentin, 2001).
Uma outra característica marcante, é a heterogeneidade da costa do estado, em função das inúmeras ilhas costeiras presentes. Estas ilhas funcionam inclusive como corredor ecológico marinho para muitas espécies, fato que apresenta vantagens e desvantagens para esta biodiversidade (Odum & Barret, 2007). A vantagem é o favorecimento da distribuição de espécies marinhas bentônicas, principalmente daquelas que se reproduzem por larvas microscópicas, e que dependem das correntes e
disponibilidade de substrato para aderir e crescer. Favorece também os filhotes de organismos marinhos, que precisam de locais mais abrigados para alimentação e crescimento. Todavia, essas ilhas-corredores também podem favorecer a dispersão de espécies exóticas invasoras, que tendem a eliminar as espécies nativas, por competição ou predação (Katsanevakis et al., 2014).
Contudo, os ecossistemas marinhos brasileiros, de um modo geral, vêm sofrendo contínua perda de biodiversidade ao longo do tempo, em função dos inúmeros impactos ambientais relacionados às atividades econômicas humanas, como: poluição por efluentes domésticos e outros tipos de substâncias contaminantes, resíduos sólidos, tráfego de embarcações, sobrepesca, dentre outros (Jungblut et al. 2018). Este é um problema mundial, que leva à simplificação dos habitats marinhos, e perda gradual da biodiversidade (Airoldi et al., 2008).
Os ecossistemas marinhos bentônicos ambientalmente saudáveis do estado do Rio de Janeiro, geralmente se configuram pela presença de bancos de Sargassum, associados aos costões rochosos (Muniz, 2008). O Sargassum é um gênero de macroalgas de cor marrom dourada, que pode chegar até 1m de comprimento, como já observado na baía da Ilha Grande. Estas algas funcionam como miniflorestas submarinas, servindo como verdadeiros berçários para outras espécies. Com o aumento dos impactos ambientais, o Sargassum entra em extinção local, e esta comunidade se torna mais empobrecida, sendo representadas majoritariamente por algas formadoras de tapete (“turf algaes”). Esse é o nome genérico, para macroalgas de formas mais simples, que cobrem as rochas, como se fossem um verdadeiro tapete.
Nas ilhas Maricás, foi verificada a presença da espécie Sargassum vulgare, em visitas realizadas na Ilha Principal. Porém, foram poucos indivíduos, pequenos e já senescentes, com o domínio de algas formadoras de tapete ao longo de todo o substrato rochoso das ilhas. Neste contexto, percebe-se que este ecossistema insular já se encontra em algum grau de degradação, mas ainda existe a possibilidade de ser restaurado. Para isso é necessário a implementação de mais esforços de pesquisa, para maior conhecimento sobre quais são os principais impactos sobre a biodiversidade, e quais as frequências e intensidade de cada um destes. Desta forma, poderão ser construídas estratégias de restauração, baseadas em protocolos técnicos aliados à implementação e aplicação de políticas públicas.
Referências bibliográficas
AIROLDI, L., BALATA, D. & BECK, M.W. 2008. The gray zone: relationships
between habitat loss and marine diversity and their applications in conservation. Journal
of Experimental Marine Biology and Ecology 366:8-15.
JUNGBLUT, S.; LIEBICH, V. & BODE-DALBY, M. (Eds.). YOUMARES 9 - The
Oceans: Our Research, Our Future. Proceedings of the 2018 Conference for YOUng
MArine RESearcher.
KATSANEVAKIS, S.; WALLENTINUS, I.; ZENETOS, A.; LEPPÄKOSKI, E.;
ÇINAR, M.E.; OZTÜRK, B.; GRABOWSKI, M.; DANIEL GOLANI, D.; &
CARDOSO, A.C. 2014. Impacts of invasive alien marine species on ecosystem services
and biodiversity: a pan-European review. Aquatic Invasions, 9 (4): 391–423.
MUNIZ, R. A. Efeitos do dossel de Sargassum vulgare (Ochrophyta – Fucales) em duas
comunidades na Baía da Ilha Grande, RJ. 2008. 159 p.Tese (Doutorado em Botânica) -
Escola Nacional de Botânica Tropical, Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de
Janeiro.
ODUM, E.P & BARRET, G.W. Fundamentos de Ecologia. 5. ed., Editora Thomson
Pioneira, 2007.
SPALDING, M.D., FOX, H.E., ALLEN, G.R., DAVIDSON, N., FERDAÑA, Z.A.,
FINLAYSON, M., HALPERN, B.S., JORGE, M.A., LOMBANA, A., LOURIE, S.A.,
MARTIN, K.D., MCMANUS, E., MOLNAR, J., RECCHIA, C.A. & ROBERTSON J.
2007. Marine Ecoregions of the World: A Bioregionalization of Coastal and Shelf
Areas. BioScience, 57: 573-583.
VALENTIN, J.L. 2001. The Cabo Frio Upwelling System, Brazil, pp. 97−105. In: U.
Seeliger and B. Kjerfve (eds.), Ecological Studies: Coastal Marine Ecosystems of Latin
America. Springer-Verlag, Heidelberg, Germany.
Comments